quarta-feira, 4 de junho de 2008

A memória da Saudade

Ainda bem que estou em Portugal, que sou portuguesa, que me sinto portuguesa. Só assim poderia sentir saudade, valha-nos uma das coisas que só nós é que temos. Além do bacalhau seco, regado com azeite, a saudade é nosso melhor ingrediente. Há muita gente que sente falta, mas só nós temos Saudade. De quê? De praticamente tudo, da maneira que isto está, só mesmo o passado nos traz algum alento.
Nas pessoas, também é no passado, por mais recente que seja, que se encontra a saudade, o que fizeram, o que falaram e o que sentiram, principalmente. Mas a partir de quando é legítimo sentir saudade?! Pode alguém sentir saudade do que só sentiu, do que partilhou, por exemplo, uma única vez?! É possível sentir saudade de um momento e não de uma “pseudo-repetição” deles? É possível isolar esse único momento? Cabe na cabeça de alguém o discernimento para identificar um momento preciso para de lá trazer a saudade?
A saudade não tem momentos únicos, não tem sensações específicas, tem uma espécie de apanhado de tudo, uma globalização pequenina de sentimento, emoção e até tacto. A saudade lembra tudo isso praticamente ao mesmo tempo, é ridícula e ingrata por vezes, é estranha e fugidia, mas nunca completamente falsa.
Pode-se ter saudade do que nunca se viveu, do que nunca se teve, mas que pela repetição do desejo, do sonho, já se sentiu, já se sofreu mais profundamente do que em alguns passados.
Tenho saudades do pequeno tempo dos momentos, únicos como todos, mas dos quais a saudade tem feito questão de me lembrar. A saudade tem muito boa memória.

1 comentário:

Boa Lingua disse...

Pois eu, caríssima X., só sinto saudades do futuro!
Também sou português, mas gosto de andar para a frente...
O que lá vai, lá vai, o "Qué será, será,
Whatever will be, will be
The Truth is not ours to see
Qué será, será..."

Beijos