sábado, 28 de agosto de 2010

o fim ou então não

Há vezes em que não se dá pelo fim. Há vezes que rezamos todos os dias e todos os minutos por ele, que é precisamente quando ele mais tarda. Há outras ainda em que demora tanto que , quando chega, já varremos o terreiro e o que restou não chega para acender o Inverno que entretanto se impôs antecipado. Mas há vezes em que o fim não acaba, é um fim com avesso, avesso esse sem ponto final, sem exclamação, e se conseguirmos, sem interrogação. Há fins que só têm reticências, há fins que são curvas e alguns têm dois sentidos. O fim com avesso tem cheiro, tem cores, tem sorrisos encolhidos e palavras atiradas ao Deus dará. O fim com avesso tem esperança, mas vive em contramão. Conheci fins que tiveram chamadas desligadas na cara, portas a bater e cd’s e livros por devolver. Conheci outros que não tiveram palavras, porque nem delas precisavam. Conheci fins que levaram lágrimas, gritos de incompreensão, pedidos de socorro aos mais próximos e passeios à beira-rio com óculos escuros. Conheci fins que não deixaram cheiro algum na almofada, ou já não apeteceu ir confirmar se deixaram ou não, e este é um tipo de fim em descanso, sem raiva, sem medo, é o fim que vem do coração, que vem do sítio (seja ele qual for) onde se guarda a mágoa, a dor, e tudo o mais que nos consome. É também o fim que não deixa grande coisa, tal como grande coisa não terá levado.
O fim, por si só, não nos consome, o que nos gasta é o que ele não leva, o que fica atravessado por fazer, por dizer, por sentir. Gásta-nos a ausência de amanhã, o mês que vem que já estará fresco e já não apetece tanto dormir destapado. Gasta-nos o sonho que ficou, o cheiro que persiste depois das lavagens a quente. E isto não deixa de ser um fim, mas dos que ainda não acabaram.
Gosto dos fins que acabam, das pontas que se uniram e foram à vida delas, de deixar de construir frases começadas por Se, de ver a Terra a girar sob outro propósito, de gavetas despejadas ou muito bem arrumadas que não se abrirão antes da próxima mudança de casa.
Gosto de fins com um carinho que não vai ter ao mesmo sítio onde um dia morreu a dor, ou onde chegou a viver a esperança. Gosto dos fins quando já têm sorrisos e abraços, mas não passam a ser cegos e não deixam de ter História, e ainda assim convivem todos.
Os outros fins não fazem fila, não entram nas agendas nem em listas de convidados. Não importam, e não importar é muito pior que doer.
Gosto de fins, mas só dos que acabam. Mesmo.